- "Remuneração dos agentes públicos constitui informação de interesse coletivo ou geral."
Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do STF ao cassar uma liminar que impedia a publicação de forma individualizada das remunerações.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

A REAÇÃO DOS MARAJÁS



A reação dos marajás

A reportagem sobre os supersalários do serviço público, publicada na versão impressa de VEJA, provoca reações acaloradas sobretudo de juízes e promotores

VEJA.COM. Por Da Redação 21 dez 2016


Uma reportagem publicada na edição impressa de VEJA neste final de semana despertou reações acaloradas. A reportagem mostrava, através de um levantamento criterioso, que mais de 5 000 servidores públicos do Executivo, do Legislativo e do Judiciário — todos na esfera apenas federal — receberam salários acima do teto constitucional, de 33 763 reais, no mês de setembro deste ano. VEJA chamou de “marajá” todo o servidor cujo salário fura o teto — seja por poucos reais, seja por vários milhares de reais. A lei determina que o teto salarial do funcionalismo público deve ser o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Ou seja: 33 763 reais. Qualquer centavo acima disso, seja a que pretexto for, é fura teto.

Houve reação de todos os poderes, mas a mais forte veio do Judiciário, sobretudo de juízes e procuradores. Em sua maioria, alegaram que só recebem além do teto de 33 763 porque agregam ao salário alguns benefícios e indenizações. É verdade. Muitos funcionários, com base em normas, resoluções e decisões de todo o tipo, embolsam todo o mês auxílios e complementos diversos que, somados ao salário-base, acabam furando o teto. Examinada sob esse ângulo, a questão dos supersalários é apenas uma questão de normas, resoluções e decisões de todo o tipo. Outro modo de analisar o assunto, e foi esse o modo adotado por VEJA, está no artigo 37, parágrafo XI da Constituição, no qual se lê que o vencimento de nenhum funcionário público, seja juiz ou procurador, seja em função de norma ou resolução, pode ultrapassar o teto “incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza”. Ou seja: o artigo 37 diz que mesmo com benefícios o teto precisa ser respeitado. Com base nisso, VEJA pesquisou quem seriam os fura-teto, quem seriam os marajás do serviço público que recebem além do que diz a Constituição.

Há muitos casos em que o artigo 37 atua para manter os vencimentos no teto. O funcionário Marco Antônio Pais dos Reys, por exemplo, que trabalha como analista legislativo do Senado, deveria receber em setembro — mês em análise por VEJA — um salário de 39 503,86 reais porque, na composição de seu remuneração, entram 25 598,28 reais de “estrutura remuneratória básica” e outros 13 905,58 de “vantagens pessoais”. Mas, como os penduricalhos todos furam o teto, o servidor recebe um abate-teto, ou seja, um corte de todo o valor acima do teto. No caso, 5 740,86 reais. Com o corte, Reys recebeu em setembro exatamente dentro do teto, tal como determina a Constituição. A lista dos marajás é composta de nomes que, mesmo quando sofrem algum tipo de abatimento, deixam o teto a ver navios. Isso não significa que os servidores estejam cometendo uma ilegalidade. A enorme maioria fura o teto porque está respaldado numa norma, numa decisão judicial, ou algo de natureza semelhante, que lhe garante receber mais do que o teto. Há vezes em que as decisões que permitem furar o teto são pura malandragem, como a permissão para que servidores públicos ganhem um “extra” por participar de conselhos administrativos de estatais. Desde 1996, esse “extra” é questionado através de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.485) no Supremo Tribunal Federal. Até hoje, não há um julgamento definitivo e, a bordo da indefinição, muitos vão embolsando o “extra” acima do teto.

Outras vezes há decisões que, de fato, podem fazer sentido, como é o caso do abono de permanência. Ele permite que o servidor, mesmo depois de completar o tempo mínimo para requerer aposentadoria, continue trabalhando em troca de um adicional. Esse mecanismo beneficia não apenas o servidor que prefere continuar na ativa como acarreta economia para o Estado, já que o funcionário deixa de receber a aposentadoria e o governo não precisa contratar ninguém para o seu lugar. Ainda assim, é um caso de fura-teto.

Na reportagem de VEJA, aparecem exemplos de servidores com altos salários de todos os poderes. No Executivo, por exemplo, o ministro do Planejamento, Dyogo Henrique de Oliveira, aparece com vencimentos de 81 700 reais em setembro. No Judiciário, a desembargadora do Tribunal Regional Federal de São Paulo, Therezinha Cazerta, recebeu 83 000 em setembro, seguida muito de perto pela juíza federal Vera Lúcia Feil Ponciano, com 82 500 reais, mas ninguém chegou perto do recorde nacional encontrado por VEJA: o juiz federal Carlos D’Ávila Teixeira, cujo salário em setembro passou de 198 000 reais. No Ministério Público, o procurador Daniel César Azeredo Avelino recebeu 97 000 reais. No Legislativo, talvez o mais transparente dos poderes no que se refere à questão salarial, o ministro José Múcio Monteiro Filho, do Tribunal de Contas da União, recebeu 51 000 reais, mas uma analista do Senado, Angela Cristina Viana, superou-o com folga: embolsou 67 200 reais.

São todos exemplos de fura-teto, mas isso não significa que recebam, todos os meses, esses valores exatos. Num determinado mês, pode haver algum desconto. Em outro, pode haver algum acréscimo, de tal modo que os valores que aparecem no contracheque sofrem variações. Para não cometer a injustiça de noticiar o caso de um servidor que recebeu acima do teto em setembro — e apenas em setembro — em função de algum acréscimo temporário, a reportagem de VEJA inicialmente identificou os fura-teto e, em seguida, conferiu se seus salários mantiveram-se acima do teto nos dois meses anteriores. Ou seja: julho e agosto. E só publicou os casos em que os salários furavam o teto em todos os meses pesquisados.

Tome-se o caso da magistrada Vera Ponciano, que recebeu 82 500 em setembro. Seu nome só aparece na lista dos fura-teto porque, em julho, ela recebeu 35 716 reais e em agosto recebeu 42 760. Ou seja: furou o teto em ambos os meses, além de setembro. Mesmo nos salários que recebeu nos meses seguintes, a magistrada também furou o teto. Recebeu 35 800 reais em outubro e 67 000 reais em novembro. Resumindo: em cinco meses examinados por VEJA, seu salário teve variações acentuadas, devido a adiantamentos e descontos, mas nunca deixou de furar o teto. A revista aplicou o mesmo critério para todos os nomes mencionados.

No serviço público, em qualquer dos três poderes, as variações salariais podem ser enormes. O ministro José Múcio, do Tribunal de Contas da União, afirma que foi incluído indevidamente na lista porque recebeu em setembro o seu abono-férias, o que elevou seu pagamento de setembro para mais de 50 000 reais. O ministro tem razão. Mas continua sendo um fura-teto. Excluindo-se o abono, seu salário cai para 40 200 reais, quantia que recebeu em julho, agosto e, excluído o abono, setembro. No seu caso, o excesso nem é tão gritante, mas beira os 7 000 reais. O assunto — supersalários no serviço público é um vespeiro. Porque mexe com privilégios, na visão de uns, e com direitos adquiridos, na visão de outros. Por isso, costuma gerar reações indignadas, tanto dos que são apontados como marajás, quanto dos leitores, revoltados com a existência de servidores fura-teto. Até agora, VEJA recebeu nota de quatro entidades fazendo contestações pontuais à reportagem. Nos links abaixo, o leitor pode conferir o conteúdo das notas e, também, os comentários que a revista julgou relevantes:


http://veja.abril.com.br/brasil/a-reacao-dos-marajas/



A farra dos marajás

Mais de 5 000 servidores federais recebem além do limite legal. A diferença daria para pagar por um mês a 400 000 aposentados que ganham salário mínimo

Por Pieter Zalis - VEJA.COM 21 dez 2016




Desde a década de 80, quando um político alagoano se lançou no cenário nacional com a fantasia de “caçador de marajás”, o Brasil tenta acabar com a praga dos supersalários de uma minoria de servidores públicos. Até hoje, não deu certo. Na semana passada, o Senado deu um passo importante nessa direção ao aprovar um pacote de três projetos que passa a incluir no teto constitucional (33.763 reais mensais) a maioria dos penduricalhos desse grupo.

Um levantamento de VEJA entre todos os funcionários públicos da ativa do Judiciário, do Executivo e do Legislativo federais mostra o tamanho do problema. A pesquisa identificou os 5.203 servidores que ganharam acima do teto em setembro. O prejuízo aos cofres públicos chega a 30 milhões de reais em um único mês. E isso sem contar aposentados, pensionistas, nem os três poderes nos níveis estadual e municipal. A diferença de 360 milhões de reais por ano daria para pagar por um mês a 400.000 aposentados que ganham o salário mínimo. Repetindo: 400.000.

Nos casos mais gritantes, um único servidor chegou a receber mais de 100 000 reais em um mês. Despontam entre os marajás figuras como o ministro do Planejamento, Dyogo de Oliveira. O drible no teto constitucional ocorre, na maior parte das vezes, em razão de uma miríade de benefícios.


http://veja.abril.com.br/brasil/a-farra-dos-marajas/


quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

A LRF NÃO CHEGOU AO RIO GRANDE




ZERO HORA 05 de janeiro de 2017 | N° 18733. EDITORIAIS


ANTONIO AUGUSTO DAVILA*



Disposições fundamentais da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101, de 4/5/2000) foram e são ignoradas ou até repelidas por governadores, Assembleia Legislativa, Judiciário, Ministério Público e, em especial, pelo Tribunal de Contas.

Cogentes de acordo com o art. 1º, § 1º, a gestão fiscal responsável e a busca do equilíbrio das contas públicas já foram tachadas de meros instrumentos ideológicos do neoliberalismo.

Obrigatória nos termos do art. 9º, a vinculação dos desembolsos e repasses ao comportamento das receitas é ignorada pelo Executivo e rechaçada pelos demais poderes, que exigem os duodécimos orçados originalmente.

Vedado pelo art. 12, § 2º, foi aprovado pela Assembleia Legislativa, neste 2016, déficit orçamentário que inclui R$ 1,3 bilhão correspondente a despesas de custeio (afronta também a regra de ouro das finanças públicas, art. 167, III da Constituição). Aliás, prática adotada “normalmente” há tempos, com ou sem maquiagens.

Irregulares e lesivas ao patrimônio público, conforme art. 17, a geração de despesas obrigatórias de caráter continuado sem a adequada estimativa do impacto orçamentário nos exercícios seguintes sempre foi aprovada pela Assembleia como regra absolutamente normal.

Obrigatória pelo art. 32, a autorização do Ministério da Fazenda para tomada de empréstimos foi ignorada e no governo anterior atingiu contornos doentios graves. Mais de R$ 6 bilhões, tomados de depósitos judiciais em ações nas quais o Estado não é parte, devidamente maquiados, foram gastos em custeio. Recursos de terceiros, com pagamento de juros e prometida devolução, não seriam operações de crédito! O TCE aceitou a fraude e o Ministério da Fazenda (STN) fez vistas grossas.

Proibido pelo art. 42, o aumento dos gastos e das contas a pagar no período pré-eleitoral de 2014 (dois últimos quadrimestres) em cerca de R$ 2 bilhões implicou crime (art. 359-C do Código Penal), apesar de comprovado, foi aceito pelo TCE sem o obrigatório encaminhamento ao Ministério Público.

Seguramente, a calamidade financeira não caiu dos céus.

*Economista