ANTONIO DELFIM NETTO
DE SÃO PAULO
Vamos tratar, nesta coluna, de um assunto triste e assustador. Triste
porque reduz a fundamental e necessária respeitabilidade do Legislativo,
do qual se espera: 1) a aprovação de Orçamentos apropriados para
estimular o desenvolvimento social e econômico do país; 2) a
fiscalização rigorosa de sua execução.Assustador porque revela o descuido com que o Executivo acompanha o trânsito das medidas propostas no Congresso que podem comprometer o equilíbrio fiscal e que, de "mansinho", vão atravessando as comissões até se tornarem sérios problemas de plenário --cujo controle vai exigir um enorme esforço da maioria governamental e que sempre termina em onerosas concessões segundo o axioma moral do Legislativo: "Quem senta à mesa, tem que negociar".
A Comissão Especial da Câmara aprovou uma misteriosa proposta de emenda constitucional que, praticamente, destitui o Poder Executivo. Termina com os tetos salariais e os controles que limitam o aumento indiscriminado da remuneração do funcionalismo público. Completa, assim, a grande missão dos sindicatos do setor em Brasília: de servidores do público, pretendem ser servidos pelo público!
Um amigo que conhece como funciona o Congresso me afirmou que tal "barbeiragem" da assessoria legislativa do Executivo não coloca em risco, de fato, o equilíbrio fiscal. É apenas uma mensagem, provavelmente eivada de irregularidades regimentais. Foi aprovada enquanto todos estavam voltados para a Rio+20 e às vésperas das festividades de São João, que pretere todos os outros compromissos.
Nenhum membro da maioria esteve presente para pedir "verificação de votos". Um bom assunto para a imprensa seria divulgar a ata da reunião da Comissão Especial para que toda a nação tome conhecimento dos argumentos dos espertos fautores para si mesmos, por intermédio do funcionalismo, à custa dos bolsos dos seus próprios eleitores!
Tomado de surpresa, o Executivo vai agora se organizar para repelir a absurda proposição que, se aprovada, nos levaria à situação de completo desequilíbrio fiscal, com consequências imediatas: uma elevação do "risco Brasil", um aumento da taxa de juros real, um aumento do custo da dívida pública interna e externa, além de desestabilizar as "expectativas" inflacionárias. Tudo aquilo que tentamos corrigir nos últimos anos.
A proposta é lenha para a fogueira que está sendo armada pelo sindicalismo encastelado em Brasília: uma reivindicação generalizada de exagerados aumentos salariais. O funcionalismo e suas viúvas precisam ser adequadamente remunerados, mas é claro também que os recursos para atendê-los têm seus limites nos bolsos dos eleitores.
Antonio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade de São Paulo. Escreve às quartas-feiras na versão impressa da Página A2.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Apesar de me manifestar contra esta PEC não posso deixar de reconhecer nela algumas justificativas plausíveis para uma democracia que o Brasil pretende ser. Estão corretos os legisladores em quererem o mesmo teto para os três Poderes e paridade salarial entre cargos assemelhados. Entretanto, quando legislam sobre o TETO, deveriam aplicar as mesmas regras para o PISO. E aí, entra a tal verticalidade beneficiando os servidores públicos menos aquinhoados nas políticas salariais dos governantes. Não é democrático e nem harmônico, estabelecer e garantir o pagamento de um teto salarial apenas para os gestores, se não for garantida uma proporção vertical para as categorias de execução nos três Poderes.
Vejam bem o que diz o eminente Delfim Netto: " Tomado de surpresa, o Executivo vai agora se organizar para repelir a absurda proposição que, se aprovada, nos levaria à situação de completo desequilíbrio fiscal, com consequências imediatas: uma elevação do "risco Brasil", um aumento da taxa de juros real, um aumento do custo da dívida pública interna e externa, além de desestabilizar as "expectativas" inflacionárias. Tudo aquilo que tentamos corrigir nos últimos anos." Ora, nada disto é arguido diante dos reajustes salariais absurdos e muito acima da inflação disitribuídos anualmente a magistrados, legisladores, ministros de Estado e cargos em comissão.
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