Lei de Acesso
Proposta de Roberto Requião reforçará decisão dos chefes dos três poderes de darem publicidade aos vencimentos dos servidores, na esteira da Lei de Acesso. Se PEC for aprovada, cairá por terra a estratégia jurídica das corporações do funcionalismo contra a divulgação do que ganham.
Mariana Haubert | CONGRESSO EM FOCO, 28/05/2012 07:00
J. Freitas/Senado. Projeto de Requião torna obrigatória a publicação "nominal" dos salários de todos os funcionários públicos
Em 16 de maio, o governo federal determinou que os salários e subsídios de todos os seus servidores deverão ser publicados mensalmente. Na semana passada, a Câmara e o Senado decidiram publicar seus contracheques também, e o Supremo Tribunal Federal entendeu, em reunião administrativa, que todos os ministros, ex-ministros e servidores também devem ter seus vencimentos publicados. Mas os servidores públicos prometem como reação uma batalha jurídica. Alegam que a decisão, consequência do início da vigência da Lei de Acesso às Informações Públicas é inconstitucional, por ferir a privacidade. Se o Congresso, porém, andar rápido, o argumento dos servidores para tentar a batalha jurídica cairá por terra. Uma proposta de emenda constitucional que tramita no Senado pretende reforçar o entendimento dos chefes dos três poderes após a Lei de Acesso e tornar obrigatória a publicação de todas as remunerações públicas.
De autoria do senador Roberto Requião (PMDB-PR), a PEC nº 3 de 2012 determina que, além da publicação anual dos valores do subsídio e da remuneração dos cargos e empregos públicos – já estabelecido pela Constituição – sejam divulgados mensalmente, e mediante relação nominal, os valores pagos a membros e servidores dos órgãos públicos, inclusive de empresas públicas e sociedades de economia mista. O projeto faz apenas uma ressalva, que suspende a regra em casos cujo sigilo da identificação do servidor seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
Nos próximos 15 dias
A PEC será analisada pela Comissão de Constituição e Justiça e caso seja aprovada, deverá ser votada pelo Plenário da Casa em dois turnos. Depois, segue para a Câmara dos Deputados. Designado como relator da matéria na CCJ, o senador Luiz Henrique (PMDB-SC) afirmou ao Congresso em Foco que pretende colocar a proposta em votação nos próximos 15 dias. “Ainda não tive tempo de analisar o texto, mas pelo que sei da proposta sou totalmente favorável, e, por isso, devo apresentar o relatório na semana que vem ou na seguinte, no máximo”, disse.
Para o relator, mesmo com a Lei de Acesso a Informações Públicas, a PEC pode dar mais segurança jurídica aos órgãos públicos, que não poderão ser contestados. “Acho que vamos ter uma proposta aprovada que dê segurança jurídica, que seja imune a interpretações e que seja clara o suficiente para ser exequível”, disse. Luiz Henrique conversou com o presidente da comissão, Eunício Oliveira (PMDB-CE), que garantiu que coloca a proposta na pauta de votações do colegiado assim que o relatório estiver pronto.
Resistência
Desde que os três poderes da República decidiram que a publicação dos salários de todos os servidores deve ser obrigatória, os sindicatos do setor decidiram comprar uma briga. A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), que reúne os empregados do Executivo, e o Sindilegis, do Legislativo, prometem uma “batalha jurídica” contra a decisão da presidente Dilma Rousseff, dos ministros do Supremo e dos presidentes da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Os sindicatos argumentam que haverá exposição da intimidade dos funcionários e riscos à segurança deles.
No entanto, Requião acredita que será uma batalha em vão, pois para o senador já há dispositivos legais suficientes que determinam tal publicação. Com a PEC aprovada, o senador acredita que as polêmicas em torno do assunto se encerrarão. No texto da proposta, Requião afirma que, embora a Constituição já determine que sejam publicados relatórios anuais com os valores do subsídio e da remuneração dos cargos e empregos públicos, “o caos a que chegou a situação da remuneração dos servidores públicos e membros do Poder, entretanto, não permite que essa providência seja suficiente para assegurar o controle social sobre o pagamento feito pelo Estado aos agentes públicos e evitar os abusos que pipocam em todos os Poderes e níveis de governo”.
Supersalários
O maior dos abusos cometidos é denunciado em série de reportagens do Congresso em Foco desde o ano passado. Trata-se do pagamento de salários a servidores públicos acima do teto definido pela Constituição, que é o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal, hoje fixado em R$ 26.723, os chamados supersalários. Em agosto do ano passado, o site publicou a lista dos 464 servidores do Senado que, de acordo com auditoria do Tribunal de Contas da União, recebiam vencimentos acima do teto. Contrariado, o Sindilegis mobilizou os donos dos supersalários a entrarem com ações contra o Congresso em Foco. A ação patrocinada pelo sindicato resultou em 50 processos contra o site. Como consequência deles, os jornalistas do Congresso em Foco foram obrigados a fazer um revesamento para representar o site em audiências de conciliação em praticamente todos os dias do mês de janeiro deste ano. Dos processos movidos, restam somente 14 ainda em tramitação. Nos demais, o site foi absolvido ou os autores acabaram desistindo das ações.
Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, independentemente da aprovação da PEC de Requião, os servidores públicos não têm razão em seus argumentos. “O patrão do servidor público é o cidadão brasileiro, que tem o direito de saber quanto seus funcionários ganham”, opina ele. O professor de Direito Administrativo da PUC de São Paulo Maurício Zockum concorda. “Eles são servidores de quem? Nossos. É o povo quem paga”, diz ele.
Se a PEC de Requião, relatada por Luiz Henrique for aprovada, qualquer dúvida que restar da evidência de que salário de servidor público deve ser público se extinguirá.
Interesses pessoais e corporativos alterando leis, desrespeito ao teto previsto, disparidades entre o maior e o menor salário, discriminação entre cargos assemelhados e discrepâncias no pagamento de salários, subsídios e vantagens discriminam os servidores públicos, afrontam princípios republicanos, estimulam desarmonia, criam divergências, alimentam conflitos e promovem privilégios a uma oligarquia no serviço público.
Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do STF ao cassar uma liminar que impedia a publicação de forma individualizada das remunerações.
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