Crédito: JOÃO LUIS XAVIER
Juremir Machado da Silva
CORREIO DO POVO- PORTO ALEGRE, QUARTA-FEIRA, 11 DE JULHO DE 2012
Refleti, refleti e refleti. Doeu demais. Minha ervilha cerebral ficou do tamanho de uma bola de bilhar. Depois de toda essa reflexão, mudei de ideia, o que raramente me ocorre, pois só reflito em situações excepcionais: passei a ser contra a divulgação dos nomes dos funcionários públicos com seus respectivos salários. É muito perigoso. Cheguei a essa conclusão não só pelo meu colossal esforço reflexivo, mas também influenciado pelo grito das corporações. Há muito não as via tão unidas. Vou tentar mostrar os meus argumentos com clareza e transparência. Há duas razões maiores para não se divulgar os nomes das pessoas: os altos e os baixos salários. Começo pelos baixos: seria muito humilhante, especialmente para professores. Melhor mesmo esconder. Não se pode expor os governos à tamanha indignidade. Fica mal para nossas autoridades provar que pagam tão pouco a X ou Y. É uma questão de direitos humanos universais.
Por outro lado, os altos salários justificam ainda mais esconder os nomes dos beneficiados. A divulgação criaria inveja, disputas e desagregação nos ambientes de trabalho. Os chefes poderiam perder o controle sobre seus subordinados, principalmente sobre os que nunca aparecem para justificar seus polpudos emolumentos (finalmente consegui usar essa palavra). De repente, todo mundo ficaria sabendo, sem precisar fazer demoradas investigações cruzando matrículas e cargos, que Fulano de Tal ganha uma fortuna para não fazer coisa alguma. Seria desastroso e até antipatriótico. Pouco republicano. A transparência não pode se sobrepor à ordem e à boa convivência no espaço laboral. Tudo aquilo que estimula o ciúme, esse sentimento baixo, deve ser evitado. Sem contar que a divulgação desse tipo de dado daria argumentos para essas sórdidas campanhas da mídia contra inocentes ganhadores de medianos salários - parece que, mesmo com penduricalhos, não se encontrou nenhum acima de modestos R$ 300 mil - mantidos por recursos públicos.
Ainda bem que temos a nossa Justiça - neutra, imparcial, objetiva e desinteressada - para conceder liminares bloqueando essa iniciativa malsã de transparência obscena. Dar nome aos bois extrapola o bom senso. Pode ser considerado revanchismo. É discriminatório. Sim, claro, isso mesmo, é bullying. Saber o salário de um deputado ou de um senador é razoável. Ninguém pensaria em sequestrá-los. Como manter certos parlamentares em cativeiro sem correr risco de extorsão? Agora, bem entendido, divulgar o salário de um ascensorista de Assembleia Legislativa, de um chefe de gabinete, de um aspone de alto nível, de um diretor disso ou daquilo, isso não. Tudo tem limite. Onde vamos parar? Não é mais possível se ter um alto salário nalgum cabide de emprego sem trabalhar e sem direito à privacidade?
Adotar essa regra de transparência pode ser terrível para o serviço público: haverá uma evasão de cérebros. Cabides ficarão ociosos. Quem vai querer um carguinho de R$ 60 mil tendo de comparecer ao emprego e ter seu contracheque exposto na Internet? De fato, como dizem alguns especialistas, o serviço está ficando inviável.
Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Realmente, Juremir. Se darem nomes aos bois, acenderá o pavio da indignação que poderá detonar o que resta de confiança nos Poderes de estado, já abalados por omissões, inoperência, atos secretos, movimentações atípicas, salários extravagantes, farras com dinheiro público, privilégios para os altos cargos e emendas que compram parlamentares fiscais do Executivo. Sou obrigado a concordar contigo. Se divulgarem o povo não será mais tão mansinho, paciente e cordato.
Interesses pessoais e corporativos alterando leis, desrespeito ao teto previsto, disparidades entre o maior e o menor salário, discriminação entre cargos assemelhados e discrepâncias no pagamento de salários, subsídios e vantagens discriminam os servidores públicos, afrontam princípios republicanos, estimulam desarmonia, criam divergências, alimentam conflitos e promovem privilégios a uma oligarquia no serviço público.
Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do STF ao cassar uma liminar que impedia a publicação de forma individualizada das remunerações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário